terça-feira, 23 de abril de 2013

A formação do português no território brasileiro

Quando aqui chegaram, os colonos portugueses encontraram um país povoado por índios. Os nativos indígenas e, tempos depois, a importação de grande número de escravos da África completa-se a base da população brasileira no período colonial: o português europeu, o índio e o negro. Apesar da presença do índio e do negro, não há como negar que a contribuição dos portugueses foi a mais relevante, social, cultural e linguisticamente.

Como a colonização se deu primeiro pelos litorais, ao lado do português houve o surgimento de uma língua geral que era, na verdade, o próprio tupi, principal língua indígena dessas regiões costeiras, simplificado e gramaticalizado pelos jesuítas. Por volta de 1809, após expulsão dos jesuítas do território brasileiro e o impedimento do uso da língua geral pelo decreto do primeiro-ministro Marques de Pombal, o português torna-se língua oficial. Ao mesmo tempo, começam a surgir traços específicos do português do Brasil – dizer “minino” (menino), “mi deu” (me deu), e o não chiar do “–s” implosivo.

Da importação dos escravos, apesar da diversidade étnica, as duas línguas que mais influenciaram foram o iorubá e o quimbundo, contribuindo, principalmente, no enriquecimento do léxico do português brasileiro (caçula, cafuné, moleque). Juntamente a essas influências formou-se a ideia polêmica de que teriam se formado “dialetos crioulos” que teriam base portuguesa porém simplificada e alterada. Tal ideia foi combatida pelos linguistas e será aqui deixada de lado visto que “as populações indígenas, africanas e mestiças aprendiam o português, manejando-o de maneira imperfeita” (Almeida Cardoso, Elis de. “A formação histórica do léxico da língua portuguesa”, A língua que falamos) apenas.


            Com a vinda da família real para o Rio de Janeiro (1808) o português dessa região foi relutanizado, marcando a pronúncia dessa região até os dias de hoje (“-s” chiado, por exemplo). Após a independência, houve maior abertura para influência de outros povos (franceses, italianos, alemães, asiáticos, holandeses).

O nheengatu

Na intenção de provocar êxito comunicativo com os nativos que aqui habitavam, os jesuítas classificaram o tupi e criaram uma gramática a partir dessa língua então chamada de língua geral, ou o nheengatu. Na qual foram incorporados português e índio.
            Segundo o professor José de Souza Martins, do Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia da USP - citado por Valdir Sanches no artigo “Sotaque vem do nheengatu, a língua brasileira” do jornal O estado de São Paulo – o nheengatu comporia o que chamaríamos “língua brasileira”, uma ponte entre o idioma do índio e o português europeu. Ainda segundo Martins, apenas os portugueses, estrangeiros em território brasileiro, falavam o português.

            É também no nheengatu que encontramos o que denominamos por caipira ou dialeto caipira, português com palavras derivadas do tupi e com certo sotaque do nheengatu. Apresentando dificuldades no uso de expressões, formas verbais, fonemas presentes no português os índios fizeram certos “ajustes” que lhes proporcionaram maior facilidade na comunicação (adição de vogais entre as consoantes como em mulher – “muié”, orelha – “oreia”; pronúncia retroflexa do “r” no qual a língua toca o céu da boca – o conhecido “poooorta” do interior). Compõe-se assim, o que Sanches coloca como “caipirês da roça”.

            Mesmo com a proibição do nheengatu como língua geral e a imposição do português como língua oficial, o “dialeto caipira” sobreviveu  em regiões como a de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas. Sobreviveram também expressões, palavras e principalmente topônimos provenientes dessa língua como: Ibirapuera, “ficar jururu”, cipó, capim, cupim, pipoca, mingau, mocotó, pajé, caipira, caboclo, mandioca, ipê, jacarandá.

Não se deve nem se pode considerar o Brasil como país monolíngue, visto a existência de dialetos em comunidades de alguns estados brasileiros (famílias japonesas na cidade de São Paulo, por exemplo, e que mantém seus idiomas maternos juntamente com o português que aqui foram adquirindo conforme necessidade) que mostram claramente a influência das línguas de outros povos que por aqui passaram.

            Durante o Brasil-Colônia já havia certa diversidade de línguas não apenas entre o português europeu e o nheengatu mas entre duas formas do próprio “falar português”, que Renato Basso (“O português na América”, O português da gente, p.77) coloca como “português brasileiro em formação”, fortemente marcado pela influência indígena e africana (principalmente no vocabulário e na fonética) cujos falantes compunham maior parte da população, cerca de 70% como observado no gráfico apresentado por Renato Basso, p.76 (Fonte: Mattos e Silva (2004)), no qual de 1538 ha 1890 aumenta o número de mulatos e diminui o de africanos e índios. A outra forma seria o português mais conservador, que resistia às interferências e era colocado em contextos oficiais e formais.

Referências Bibliográficas:

CUNHA, C. F. e CINTRA, L. F. Introdução, Caps. I e II. In: Nova Gramática do Português Contemporâneo. 5ª ed. 4ª impr. Rio de Janeiro: Lexikon, 2010 [1ª edição de 1984].

TEYSSIER, P. “O português do Brasil”. [Cap. IV, p. 93 e ss]. In.: História da língua portuguesa. [Trad. Celso Cunha]. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

BEARZOTI FILHO, P. “A Formação do português brasileiro”, p.55. In.: Formação linguística do Brasil. Curitiba : Nova Didática, 2002.

BASSO, Renato. O português da gente: A língua que estudamo, a língua que falamos. São Paulo: contexto

SILVA ANTÔNIO, Luiz, da. A língua que falamos: Português, história, variações, discurso. GLOBO, 2005

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